ATTENAS AULAS

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

ATTENAS: CASA DA ARTE DE ENSINAR!


Ensina a teu filho que o Brasil tem jeito e que ele deve crescer feliz por ser brasileiro. Há neste país juízes justos, ainda que esta verdade soe como cacófato. Juízes que, como meu pai, nunca empregaram familiares, embora tivessem filhos advogados, jamais fizeram da função um meio de angariar mordomias e, isentos, deram ganho de causa também a pobres, contrariando patrões gananciosos ou empresas que se viram obrigadas a aprender que, para certos homens, a honra é inegociável.
            Ensina a teu filho que neste país há políticos íntegros como Antônio Pinheiro, pai do jornalista Chico Pinheiro, que revelou na mídia seu contracheque de parlamentar e devolveu aos cofres públicos jetons de procedência duvidosa.
Saiba o teu filho que, no monolito preto do Banco Central, em Brasília, onde trabalham cerca de 3 mil pessoas, a maioria é honrada e, porque não é cega, indignada ante maracutaias de autoridades que deveriam primar pela ética no cargo que lhes foi confiado.
            Ensina a teu filho que não ter talento esportivo ou rosto e corpo de modelo, e sentir-se feio diante dos padrões vigentes de beleza, não é motivo para ele perder a auto-estima. A felicidade não se compra nem é um troféu que se ganha vencendo a concorrência. Tece-se de valores e virtudes e desenha, em nossa existência, um sentido pelo qual vale a pena viver e morrer.
            Ensina a teu filho que o Brasil possui dimensões continentais e as mais fertéis terras do planeta. Não se justifica, pois, tanta terra sem gente e tanta gente sem terra. Assim como a libertação dos escravos tardou, mas chegou, a reforma agrária haverá de se implantar. Tomara que regada com muito pouco sangue.
            Saiba o teu filho que os sem-terra que ocupam áreas ociosas e prédios públicos são, hoje, chamados de "bandidos", como outrora a pecha caiu sobre Gandhi sentado nos trilhos das ferrovias inglesas e Luther King ocupando escolas vetadas aos negros.
            Ensina a teu filho que pioneiros e profetas, de Jesus a Tiradentes, de Francisco de Assis a Nelson Mandela, são invariavelmente tratados, pela elite de seu tempo, como subversivos, malfeitores, visionários.
            Ensina a teu filho que o Brasil é uma nação trabalhadora e criativa. Milhões de brasileiros levantam cedo todos os dias, comem aquém de suas necessidades e consomem a maior parcela de sua vida no trabalho, em troca de um salário que não lhes assegura sequer o acesso à casa própria. No entanto, essa gente é incapaz de furtar um lápis do escritório, um tijolo da obra, uma ferramenta da fábrica. Sente-se honrada por não descer ao ralo que nivela bandidos de colarinho branco com os pés-de-chinelo. É gente feita daquela matéria-prima dos lixeiros de Vitória que entregaram à polícia sacolas recheadas de dinheiro que assaltantes de banco haviam escondido numa caçamba.
           Ensina teu filho a evitar a via preferencial dessa sociedade neoliberal que nos tenta incutir que ser consumidor é mais importante que ser cidadão, incensa quem esbanja fortuna e realça mais a estética que a ética.
           Saiba o teu filho que o Brasil é a terra de índios que não se curvaram ao jugo português e de Zumbi, de Angelim e frei Caneca, de madre Joana Angélica e Anita Garibaldi, dom Hélder Câmara e Chico Mendes.
            Ensina a teu filho que ele não precisa concordar com a desordem estabelecida e que será feliz se se unir àqueles que lutam por transformações sociais que tornem este país livre e justo. Então, ele transmitirá a teu neto o legado de tua sabedoria.
             Ensina teu filho a votar com consciência e jamais ter nojo de política, pois quem age assim é governado por quem não tem e, se a maioria tiver a mesma reação, será o fim da democracia. Que o teu voto e o dele sejam em prol da justiça social e dos direitos dos brasileiros imerecidamente tão pobres e excluídos, por razões políticas, dos dons da vida.
             Ensina a teu filho que a uma pessoa bastam o pão, o vinho e um grande amor. Cultiva nele os desejos do espírito. Saiba o teu filho escutar o silêncio, reverenciar as expressões de vida e deixar-se amar por Deus que o habita.Ensina a teu filho 

 FREI BETTO - Artigo - O Estado de S. Paulo

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sábado, 5 de outubro de 2013

ATTENAS - CASA DA ARTE DE ENSINAR! BUSCAMOS SER ESSA ESCOLA DO FREI BETTO

A Escola dos meus Sonhos
 Frei Betto

Na escola dos meus sonhos, os alunos aprendem a cozinhar, costurar, consertar eletrodomésticos, a fazer pequenos reparos de eletricidade e de instalações hidráulicas, a conhecer mecânica de automóvel e de geladeira e algo de construção civil. Trabalham em horta, marcenaria e oficinas de escultura, desenho, pintura e música. Cantam no coro e tocam na orquestra. Uma semana ao ano integram-se, na cidade, ao trabalho de lixeiros, enfermeiras, carteiros, guardas de trânsito, policiais, repórteres, feirantes e cozinheiros profissionais. Assim aprendem como a cidade se articula por baixo, mergulhando em suas conexões que, à superfície, nos asseguram limpeza urbana, socorro de saúde, segurança, informação e alimentação.
Não há temas tabus. Todas as situações-limite da vida são tratadas com abertura e profundidade: dor, perda, falência, parto, morte, enfermidade, sexualidade e espiritualidade. Ali os alunos aprendem o texto dentro do contexto: a Matemática busca exemplos na corrupção dos precatórios e nos leilões das privatizações; o Português, na fala dos apresentadores de TV e nos textos de jornais; a Geografia, nos suplementos de turismo e nos conflitos internacionais; a Física, nas corridas de Fórmula-1 e nas pesquisas do supertelescópio Huble; a Química, na qualidade dos cosméticos e na culinária; a História, na violência de policiais contra cidadãos, para mostrar os 
antecedentes na relação colonizadores - índios, senhores - escravos, Exército - Canudos, etc.
Na escola dos meus sonhos, a interdisciplinaridade permite que os professores de Biologia e de Educação Física se complementem; a multidisciplinaridade faz com que a História do livro seja estudada a partir da análise de textos bíblicos; a transdisciplinaridade introduz aulas de meditação e dança e associa a história da arte à história das ideologias e das expressões litúrgicas. Se a escola for laica, o ensino religioso é plural: o rabino fala do judaísmo, o pai-de-santo, do candomblé; o padre, do catolicismo; o médium, do espiritismo; o pastor, do protestantismo; o guru, do budismo, etc. Se for católica, há periódicos retiros espirituais e adequação do currículo ao calendário litúrgico da Igreja. Na escola dos meus sonhos, os professores são obrigados a fazer periódicos treinamentos e cursos de capacitação e só são admitidos se, além da competência, comungam os princípios fundamentais da proposta pedagógica e didática. Porque é uma escola com ideologia, visão de mundo e perfil definido do que sejam democracia e cidadania. Essa escola não forma consumidores, mas cidadãos.
Ela não briga com a TV, mas leva-a para a sala de aula: são exibidos vídeos de anúncios e programas e, em seguida, analisados criticamente. A publicidade do iogurte é debatida; o produto adquirido; sua química, analisada e comparada com a fórmula declarada pelo fabricante; as incompatibilidades denunciadas, bem como os fatores porventura nocivos à saúde. O programa de auditório de domingo é destrinchado: a proposta de vida subjacente, a visão de felicidade, a relação animador-platéia, os tabus e preconceitos reforçados, etc. Em suma, não se fecham os olhos à realidade, muda-se a ótica de encará-la. Há uma integração entre escola, família e sociedade. A Política, com P maiúsculo, é disciplina obrigatória. As eleições para o grêmio ou diretório estudantil são levadas a sério e, um mês por ano, setores não vitais da instituição são administrados pelos próprios alunos. Os políticos e candidatos são convidados para debates e seus discursos analisados e comparados às suas práticas.
Não há provas baseadas no prodígio da memória nem na sorte da múltipla escolha. Como fazia meu velho mestre Geraldo França de Lima, professor de História (hoje romancista e membro da Academia Brasileira de Letras), no dia da prova sobre a Independência do Brasil, os alunos traziam para a classe a bibliografia pertinente e, dadas as questões, consultavam os textos, aprendendo a pesquisar. Não há coincidência entre o calendário gregoriano e o curricular. João pode cursar a 5ª série em seis meses ou em seis anos, dependendo de sua disponibilidade, aptidão e seus recursos. É mais importante educar do que instruir; formar pessoas que profissionais; ensinar a mudar o mundo que ascender à elite. Dentro de uma concepção holística, ali a ecologia vai do meio ambiente aos cuidados com nossa unidade corpo-espírito e o enfoque curricular estabelece conexões com o noticiário da mídia.
Na escola dos meus sonhos, os professores são bem pagos e não precisam pular de colégio em colégio para se poderem manter. Pois é a escola de uma sociedade em que educação não é privilégio, mas direito universal, e o acesso a ela, dever obrigatório.

Frei Betto é escritor, autor do romance "O Vencedor" (Ática), entre outros livros.